Livro: Meu Pai, o Guru do Presidente


Heloisa de Carvalho é a primogênita entre os oito filhos do escritor Olavo de Carvalho (1947-2022). Henri Bugalho com formação em Filosofia, é escritor e YouTuber. Ambos uniram-se em 2020 para escrever e publicar o livro Meu Pai, o Guru do Presidente. Henri, com sua experiência, teria ajudado a estudante de Direito, Heloísa, na tarefa de registrar seu alerta à sociedade brasileira contra seu pai, Olavo, o referido “guru”.

E o livro é apenas isso, mesmo: Heloísa contando sua experiência de filha. Ela, que em certa altura rompeu relações com o pai, explica seus motivos. Olavo seria alguém acostumado a tirar proveito de outros e, na época de produção e lançamento do filme Jardim das Aflições (um documentário sobre ele  mesmo) teria negado os créditos devidos a um de seus produtores, amigo dela. Eis a gota d’água no copo, então transbordante, de Heloísa!

Ruptura estabelecida, pai e filha passaram a se estranhar virtualmente, trocando farpas implícitas e acusações explícitas. Diante da notoriedade que Olavo alcançou e da influência que exerceria junto ao presidente da República do Brasil, a filha sente-se no dever de alertar a nação contra aquele que considera ser um aproveitador sem escrúpulos, um charlatão com quem se deve tomar todo o cuidado.

Logo nas primeiras páginas, Heloísa conta suas lembranças de infância, a tentativa de suicídio da mãe; a insensibilidade do pai - que teria obrigado os filhos a observar a mãe ensanguentada e presa a uma camisa de forças. Olavo é descrito como, no mínimo, um homem desatento, que não se dava conta das necessidades que crianças têm, como um lar seguro, estabilidade e afeto, e coisas básicas como alimentação e atenção, formação cultural e educação geral. A família habitava o quartinho dos fundos de uma escola esotérica, enquanto Olavo transitava entre a astrologia e o esoterismo islâmico, em simultâneo à manutenção de seus vários casos com mulheres, suas alunas, e à escrita de seus textos, cursos e livros.

O retrato que Heloísa traça é de um homem disposto a tirar aproveito das relações com pessoas “endinheiradas”, como ela diz, e se firmar como um líder. A megalomania e o carisma de Olavo seriam traços marcantes de sua personalidade, sempre presentes, e dos quais ele teria intenção de tirar proveito também em sua nova condição de “guru do presidente”.

Na verdade, não há nada no livro que em 2020, ano de sua publicação, já não tivesse sido “revelado” por meio da Internet. Olavo sempre falou de si mesmo ao expressar-se, sua megalomania sempre esteve evidente. Suas táticas imorais para calar os oponentes e sobressair-se como único controlador do caos já não era segredo para observadores que nem precisavam estar tão atentos.

Confesso que não entendi qual a contribuição de Henri Bugalho como autor... Justamente por sua participação, eu esperava mais do livro, como análises bem fundamentadas da personalidade e da trajetória de Olavo. Não há nada sequer parecido com isso. Não desmereço o relato feito pela filha Heloísa. Ela fala de seu próprio ponto de vista, de suas experiências que não podem ser anuladas nem mesmo pelas vivências de seus irmãos mais novos, que partilharam outros momentos da vida do pai, vividos de outras formas melhores ou piores. O que Heloísa quer dizer, em última instância, é que o comportamento de seu pai não é condizente com o "conservadorismo cristão" que ele diz defender, que ele é um embuste, que tem uma personalidade destrutiva, nociva, altamente capaz de agregar outros como ele, alimentar mentes fanatizadas e provocar danos. 

O livro não esclarece como se formou o homem Olavo, como teria sido sua própria infância e juventude, como teria acontecido sua formação, quais os fatos que teriam marcado sua personalidade, com quem ele teria se relacionado quando jovem e como suas relações sociais teriam alterado seus caminhos. Apresentar uma biografia não era o objetivo da autora, mas essas são lacunas que um jornalismo investigativo sério, isento ao máximo, pode vir a preencher no futuro. 



CARVALHO, Heloisa de; Bugalho, Henri. Meu pai, o guru do presidente. Curitiba: Kotter/247, 2020, p. 162.